As constantes fugas de cubanos, através de frágeis balsas artesanais,
continuam. Ainda na semana passada, a imprensa noticiou que oito cubanos
chegaram à costa americana com uma balsa cujo motor era de um trator soviético.
Vou relatar o caso do qual participei, relativo a uma trágica fuga. Foi
no dia 1° de setembro. Eu estava chegando em Manzanillo, uma cidade litorânea
de Cuba, no lado oriental, com 130 mil habitantes. De repente, um jovem se
aproxima do grupo com quem eu estava e comunica: “as autoridades do México revelaram
que uma balsa, saída de Manzanillo foi salva pela guarda costeira, depois que
essa foi avisada por um navio cargueiro, de que uma embarcação estava à deriva.
Sabe-se que, dos 32 ocupantes, apenas 15 se salvaram depois de 24 dias à deriva”
Os sobreviventes de Manzanillo ainda no barco |
Foi como uma bomba para aquela
pequena cidade. As famílias dos que fugiram ficaram apavoradas. Estariam os familiares
entre os mortos? Foram dois dias de
angústia e desesperança aguardando mais notícias. Acompanhei a dor de parentes
e amigos. Um deles me disse que dois colegas de trabalho, em uma loja de
calçados, haviam desaparecido, o que fazia supor que estivessem entre os que
empreenderam a fuga. Dias depois veio a confirmação de que os dois estavam
entre os sobreviventes.
Na cidade, aos poucos, as famílias começaram a saber notícias pelo
telefone e pelo envio de reportagens publicadas nos jornais do México. Os sobreviventes relataram que no dia
7 de agosto, 32 cubanos, na maioria jovens, depois de meses de preparação,
saíram às escondidas das praias de Manzanillo, em um frágil barco construído
com um motor de caminhão, munidos apenas de algumas de câmaras de ar de
caminhão e de alimentos. Pelo trajeto normal, a balsa iria até as ilhas Caimãn
e dali para Honduras ou México. Este é o destino da maioria dos fugitivos. Em
Caimãn, a balsa seria abastecida e seguiria viagem. Em dois a três dias, chegariam
ao continente. Mas o destino foi cruel com esses 32 cubanos. Nos primeiros
quilômetros da viagem, o motor parou de funcionar. Oito cubanos decidiram
voltar a nado, porém não chegaram à praia. Morreram afogados. Restaram 24.
Estes ficaram vagando pelo oceano por 24 dias. Sem GPS e sem prática de se
guiarem pelas estrelas à noite, ficaram a deriva até serem avistados por um
barco pesqueiro que avisou a Marinha mexicana e esta os resgatou. Dos 24
cubanos estavam apenas 17 a
bordo, mas dois já estavam mortos e seus
corpos ainda não tinham sido jogados no mar. Era um jovem de 16 anos e um homem
de 30 anos. Os relatos dos que se salvaram são horripilantes. Para tentar
salvar uma mulher grávida de seis meses, os ocupantes do barco chegaram a
cortar seus pulsos para dar sangue à grávida.
Um dos mortos sendo recolhido |
Os sobreviventes dessa catástrofe estão presos no México. Ainda estão
aguardando a possibilidade de seguir viagem à Flórida, se tiverem sorte e
dinheiro. Isto porque há um acordo entre México e Cuba para devolução dos que
chegam à costa do México, mas conforme o valor de propina dada às autoridades
mexicanas, podem ser liberados. A corrupção tem facilitado, para muitos, a
entrada nos Estados Unidos.
Assim, continua a aflição das famílias que não sabem se o ente querido
vai para os EUA ou voltará para Cuba onde ficaria preso por alguns anos.
Manzanillo está cansada de chorar seus mortos, pois é uma cidade pequena
onde a maioria das pessoas se conhece.
Por ser uma cidade costeira, dali parte a maioria dos aventureiros, rumo
ao ocidente. Não há ninguém na cidade que não tenha um ente querido nas listas dos
mortos em fugas: ora é um filho, neto, primo, prima
ou amigo.
Vivenciar a dor da comunidade, à medida que chegavam notícias sobre o
episódio, obtidas pelas raras pessoas que têm acesso a internet, foi muito
triste para mim, mas na verdade era apenas mais uma história das milhares
existentes, sobre a fuga de cubanos do “paraíso” de Fidel Castro, rumo aos
Estados Unidos.
Esta fuga pelo sistema de balsas aumentou nos últimos anos e
seguidamente há notícias da chegada de sobreviventes aos Estados Unidos. Nessa
semana em que estive em Manzanillo, outras três balsas foram bem sucedidas em
suas viagens.
Aos poucos, fiquei sabendo que já
somam 35 mil os fugitivos que tiveram êxito em chegar aos Estados Unidos,
utilizando balsas artesanais. O país fornece imediatamente o visto americano
aos imigrantes e a Florida é o Estado americano preferido para viverem. Ninguém
sabe quantos já morreram na travessia. Estima-se que uma balsa, a cada três que
se evadem, chega à costa americana.
Os felizardas salvos usando um caminhão |
Em abril passado, uma histórica travessia foi feita por 22 pessoas: a
balsa foi construída tendo por base, grandes tonéis e sobre eles, um caminhão
com carroceria. Um toldo foi colocado em cima para o abrigo do sol. Em apenas
20 horas, o grupo chegou aos Estados Unidos.
No total, desde 1959, já fugiram em torno de 2 milhões de cubanos. Em
1995, Fidel Castro disse que quem quisesse ir-se de Cuba, que se fosse. Ocorreu
que135 mil pessoas saíram. Depois disso, o governo endureceu e agora pune os
que são devolvidos. Anualmente outras 45 mil pessoas saem de Cuba, de forma
legal, para países como Estados Unidos e Espanha. Mas que país é esse onde o
sonho de qualquer jovem é sair de sua pátria? A verdade é dura, pois todos
lutam para apenas sobreviver. Ali não existe futuro, nem esperança de uma
mudança rápida que traga bem estar para a população.
Nenhum comentário:
Postar um comentário