domingo, 28 de setembro de 2014

Como fugir de Cuba?



As constantes fugas de cubanos, através de frágeis balsas artesanais, continuam. Ainda na semana passada, a imprensa noticiou que oito cubanos chegaram à costa americana com uma balsa cujo motor era de um trator soviético.
Vou relatar o caso do qual participei, relativo a uma trágica fuga. Foi no dia 1° de setembro. Eu estava chegando em Manzanillo, uma cidade litorânea de Cuba, no lado oriental, com 130 mil habitantes. De repente, um jovem se aproxima do grupo com quem eu estava e comunica: “as autoridades do México revelaram que uma balsa, saída de Manzanillo foi salva pela guarda costeira, depois que essa foi avisada por um navio cargueiro, de que uma embarcação estava à deriva. Sabe-se que, dos 32 ocupantes, apenas 15 se salvaram depois de 24 dias à deriva”
Os sobreviventes de Manzanillo ainda no  barco

 Foi como uma bomba para aquela pequena cidade. As famílias dos que fugiram ficaram apavoradas. Estariam os familiares entre os mortos?  Foram dois dias de angústia e desesperança aguardando mais notícias. Acompanhei a dor de parentes e amigos. Um deles me disse que dois colegas de trabalho, em uma loja de calçados, haviam desaparecido, o que fazia supor que estivessem entre os que empreenderam a fuga. Dias depois veio a confirmação de que os dois estavam entre os sobreviventes.

Na cidade, aos poucos, as famílias começaram a saber notícias pelo telefone e pelo envio de reportagens publicadas nos jornais do  México. Os sobreviventes relataram que no dia 7 de agosto, 32 cubanos, na maioria jovens, depois de meses de preparação, saíram às escondidas das praias de Manzanillo, em um frágil barco construído com um motor de caminhão, munidos apenas de algumas de câmaras de ar de caminhão e de alimentos. Pelo trajeto normal, a balsa iria até as ilhas Caimãn e dali para Honduras ou México. Este é o destino da maioria dos fugitivos. Em Caimãn, a balsa seria abastecida e seguiria viagem. Em dois a três dias, chegariam ao continente. Mas o destino foi cruel com esses 32 cubanos. Nos primeiros quilômetros da viagem, o motor parou de funcionar. Oito cubanos decidiram voltar a nado, porém não chegaram à praia. Morreram afogados. Restaram 24. Estes ficaram vagando pelo oceano por 24 dias. Sem GPS e sem prática de se guiarem pelas estrelas à noite, ficaram a deriva até serem avistados por um barco pesqueiro que avisou a Marinha mexicana e esta os resgatou. Dos 24 cubanos estavam apenas 17 a bordo, mas dois já estavam mortos e  seus corpos ainda não tinham sido jogados no mar. Era um jovem de 16 anos e um homem de 30 anos. Os relatos dos que se salvaram são horripilantes. Para tentar salvar uma mulher grávida de seis meses, os ocupantes do barco chegaram a cortar seus pulsos para dar sangue à grávida.
Um dos mortos sendo recolhido

Os sobreviventes dessa catástrofe estão presos no México. Ainda estão aguardando a possibilidade de seguir viagem à Flórida, se tiverem sorte e dinheiro. Isto porque há um acordo entre México e Cuba para devolução dos que chegam à costa do México, mas conforme o valor de propina dada às autoridades mexicanas, podem ser liberados. A corrupção tem facilitado, para muitos, a entrada nos Estados Unidos.
Assim, continua a aflição das famílias que não sabem se o ente querido vai para os EUA ou voltará para Cuba onde ficaria preso por alguns anos.
Manzanillo está cansada de chorar seus mortos, pois é uma cidade pequena onde a maioria das pessoas se conhece.  Por ser uma cidade costeira, dali parte a maioria dos aventureiros, rumo ao ocidente. Não há ninguém na cidade que não tenha um ente querido nas listas dos mortos em fugas: ora é um filho, neto,  primo, prima  ou amigo.
Vivenciar a dor da comunidade, à medida que chegavam notícias sobre o episódio, obtidas pelas raras pessoas que têm acesso a internet, foi muito triste para mim, mas na verdade era apenas mais uma história das milhares existentes, sobre a fuga de cubanos do “paraíso” de Fidel Castro, rumo aos Estados Unidos.
Esta fuga pelo sistema de balsas aumentou nos últimos anos e seguidamente há notícias da chegada de sobreviventes aos Estados Unidos. Nessa semana em que estive em Manzanillo, outras três balsas foram bem sucedidas em suas viagens.
 Aos poucos, fiquei sabendo que já somam 35 mil os fugitivos que tiveram êxito em chegar aos Estados Unidos, utilizando balsas artesanais. O país fornece imediatamente o visto americano aos imigrantes e a Florida é o Estado americano preferido para viverem. Ninguém sabe quantos já morreram na travessia. Estima-se que uma balsa, a cada três que se evadem, chega à costa americana.
Os felizardas salvos usando um caminhão

Em abril passado, uma histórica travessia foi feita por 22 pessoas: a balsa foi construída tendo por base, grandes tonéis e sobre eles, um caminhão com carroceria. Um toldo foi colocado em cima para o abrigo do sol. Em apenas 20 horas, o grupo chegou aos Estados Unidos.
No total, desde 1959, já fugiram em torno de 2 milhões de cubanos. Em 1995, Fidel Castro disse que quem quisesse ir-se de Cuba, que se fosse. Ocorreu que135 mil pessoas saíram. Depois disso, o governo endureceu e agora pune os que são devolvidos. Anualmente outras 45 mil pessoas saem de Cuba, de forma legal, para países como Estados Unidos e Espanha. Mas que país é esse onde o sonho de qualquer jovem é sair de sua pátria? A verdade é dura, pois todos lutam para apenas sobreviver. Ali não existe futuro, nem esperança de uma mudança rápida que traga bem estar para a população.

           



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