quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Povo cubano sofre com o desabastecimento


Um dos problemas que enfrentei em Cuba foi a falta de alguns produtos básicos nas lojas, mesmo onde se pode comprar com CUCs. Explico. Existem duas moedas em circulação em Cuba: o peso cubano e o peso em divisas, chamado CUC, que praticamente equivale ao dólar. Um CUC é igual a 24 pesos. Os salários são pagos em pesos e eles servem para a população adquirir os produtos a preços subsidiados em lojas do governo ou privadas. Existem lojas que só vendem em CUCs e têm produtos mais diversificados. Isto significa que, quem tem dinheiro pode comprar nessas lojas.
Interior de uma farmácia

Visitando as famílias e sentindo que tinham privações de vários produtos necessários em suas casas, interessei-me em saber sobre como funciona o abastecimento nesse país. Em primeiro lugar aprendi a importância da “libreta” de produtos de alimentação. Cada família possui uma libreta para compra, em pesos cubanos, em armazéns próprios do governo. Não é uma compra livre, pois os tipos e as quantidades são determinadas pelo governo, de acordo com o número de membros da família. Por isso, poder-se-ia dizer que “nenhum cubano passa fome”, já que todos recebem estes alimentos. Antigamente essa quota de alimentos básicos era mais variada e calculada para o mês inteiro, mas hoje, na verdade, contempla poucos produtos que só duram em torno de 12 a 13 dias. Para o restante dos dias, a família deverá “se virar” como todos dizem. Pela Libreta, a família compra de acordo com o número de pessoas da família. Tudo é medido em libras. Uma libra equivale a 453 gramas. Assim, para uma família de seis pessoas, conforme foto, a família recebe de arroz 15 lb, ou seja, 6,80 kg; grãos: 30 lb ou 13,60 kg; azeite: l litro; açúcar refinado: 3lb ou 1,60 kg; açúcar comum: 9 lb ou 4, 82 kg; sal: 1 lb ou 453 gramas; café: 3 lb ou 1,36 kg.
Capa de uma libreta

Dados de setembro de 2014
O problema é que o cubano tem de comprar outros produtos essenciais, em CUC, nas lojas estatais como a TRD Caribe e a Cimex. Por isso, o pai ou mãe de família, a cada mês, precisa fazer uma matemática difícil para que todos se alimentem adequadamente e tenham o necessário. Muitas famílias recebem dinheiro enviado por parentes no exterior e “fazem algum bico” ou vendem algum produto que fabricam para conseguir alguns CUCs.Há anos, há uma desorganização no abastecimento de produtos como sabão, sabonete, shampus, desodorantes, aparelhos de barba, colônias, desengraxantes, cremes capilares, hidratantes, tintas para cabelo, esmaltes de unhas e toda a espécie de perfumarias. O jornal Granma, órgão oficial do governo, no dia 4 de agosto de 2014, destacou uma matéria falando sobre o chamado “desabastecimento cíclico”, ou seja periodicamente faltam produtos essenciais para asseio e limpeza. As explicações dizem que há um descompasso entre o consumo e a produção industrial. Ano após ano, diminui a produção e o governo é obrigado a importar produtos a preços maiores. Os próprios órgãos do governo admitem as dificuldades, por causa da crise financeira do país e pelo absoluto sucateamento das indústrias que, a cada ano, produzem menos. A diretora de Vendas e Registro de Consumidores, Sara del Pilar Pilar, do Ministério de Indústria e de Comércio Interior, no dia 22 de agosto de 2014, no jornal Granma afirmou que “não era justificável a ausência e a instabilidade de fósforos na rede comercial, pois constitui uma negligência dos funcionários das empresas de Comércio que não garantiram a presença estável deste produto”. Com relação à falta de batata doce, disse Sara, que a produção de 2014 foi de 65 mil e 700 toneladas, que comparada a de 2013, diminuiu 48 toneladas. “Estas cifras mostram que apesar de todas as medidas administrativas e estratégias de distribuição adotadas, a produção da batata doce, tão comum na cozinha cubana, impossibilita satisfazer a demanda da população”. Com relação à falta de sal, disse a dirigente: “não tem justificativa para que ocorra desabastecimento de sal, pois não é observada a cadeia do produtor, do distribuidor por atacado e varejo, e não se cumpre o que é exigido pelas cláusulas contratuais”.
                 São apenas alguns fatos que explicam o descompasso da economia cubana para o abastecimento da população. Disse-me uma dona de casa, que este desabastecimento de produtos é uma realidade de muitos anos e a cada ano se agrava. Por isso, quando a população fica sabendo que um determinado produto chegou a uma loja, todos correm para comprar.
A bicicleta, meio de transporte de mercadorias
Tive experiências concretas em relação à falta de produtos básicos como o papel higiênico e lâminas de barbear. Verifiquei em banheiros de duas casas que visitei, o uso de papel jornal ou de páginas das listas de telefone que servem de papel higiênico. Isto aconteceu na cidade de Bayamo. Por encomenda de um amigo, levei dezenas de barbeadores G3 do Brasil, pois há muitos meses ele não consegue comprá-los lá. Esta situação fez-me lembrar da realidade da vida de Moscou, há 24 anos atrás, quando houve a implosão do comunismo, com o presidente da Perestroika, Mikhail Gorbachev. Cuba está passando pelo mesmo desabastecimento que ocorreu na ex-União-Soviética.

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